domingo, 20 de janeiro de 2013

Sob a névoa do pseudonacionalismo

Promessas e frustrações: por onde estarão
as mudanças, senhor presidente Marin?
(Foto: Marcelo Sayao/EFE)
E aproxima-se o dia da primeira convocação de Luiz Felipe Scolari no seu retorno à seleção brasileira para o amistoso diante da Inglaterra, em Wembley. Muito se especula se o técnico alterará todo o legado deixado por Mano Menezes ou continuará com o trabalho do antecessor. Sinceramente, desejo que haja fortes mudanças.

Na verdade, o assunto a ser tratado nas próximas linhas é exatamente o oposto das esperançosas mudanças que citei. Passou-se tanto tempo, e nada mudou. Entenda.

Assim que abriu o evento de apresentação do novo treinador do Brasil, o presidente da Confederação Brasileira de Futebol, José Maria Marin, apelou para o nacionalismo para explicar a escolha de Felipão. Afinal, “os títulos que nós conquistamos, foram obtidos graças ao trabalho dos nossos técnicos”, como ele mesmo declarou. O cartola definiu o retorno de Scolari como o melhor que o nosso país pode oferecer atualmente para o “principal sustentáculo do futebol brasileiro” para atingir o objetivo maior de conquistar a tão desejada Copa do Mundo de 2014. Pegou pesado, Marin.

Pessoalmente, não vejo de forma negativa a volta do principal responsável por conquistar o pentacampeonato desacreditado e pouco valorizado por muitos de 2002. Lamento, porém, por mais uma oportunidade desperdiçada pelos principais dirigentes do país para renovar o futebol canarinho. Obrigado por tudo o que o senhor conquistou para nós, Felipão, mas agora não era a sua hora. Estava na hora daquilo que nunca teremos de fato, não só no esporte, mas em todos os ramos que partem da sociedade: transformações, as verdadeiras.

A partir do momento que todo um projeto não ocorre como o esperado, é normal, assim como apelou Marin, enaltecer o nacionalismo. Aliado a isso, a nostalgia. Claro, pois é sempre fácil lembrar-se do passado para criticar o presente e ansiar por um futuro melhor. Nosso futebol vive isso. Na verdade, nosso povo, que, aliás, é sempre o único iludido e desamparado personagem de toda a história que surgiu desde a colonização portuguesa em 1500.


Felipão e Parreira: heróis de guerra em tempo de paz. Fizeram muito no passado,
mas não são qualificados para assumir os papeis nos quais foram escolhidos
(Foto: Bruno de Lima)
Jogo rápido: após um bom tempo aprisionado ao sistema lusitano de governo, veio aquele que seria o homem para, assim como se desencadeava na América Latina, liderar o processo de independência do Brasil. O imperador D. Pedro deu o famoso “Grito do Ipiranga” para elevar o país ao nível que merecia. Espera, um imperador liderando o processo libertador contra um sistema monárquico? Pois bem, avancemos o tempo: década de 60. Visando acompanhar a implantação do nacionalismo (olha ele aí mais vez) adotado pelos europeus em consequência do Iluminismo provindo da Revolução Francesa, foi prometido ao povo mudanças (de novo?) para que o país atingisse o patamar que era digno. Resultado? Brasil, ame-o ou deixe-o. Tudo bem, após o lamentável episódio da Ditadura Militar – a qual Marin teve significativa atuação -, veio o sistema que era definido como o único capaz de servir democraticamente a nação: a República. O primeiro presidente do país? Sarney. Transformações. Todas falsas, ilusórias, e, como escrevi no início deste texto, também aconteceram no futebol.

Esse passeio pela história foi necessário apenas para enfatizar o tema aqui proposto, aplicado ao futebol, que tem como a ponta do iceberg a nomeação de Felipão na Seleção. E quem representa a sociedade nesse caso é o torcedor. Achei covarde o apelo de Marin ao mencionar o nacionalismo e o torcedor no início de mais uma tentativa das ilusórias transformações. Afinal, se não era a hora de Felipão retornar, o que dizer da escolha de Carlos Alberto Parreira como diretor técnico? Outro que fez muito pelo futebol brasileiro, mas que não era o nome certo para um projeto tão ambicioso como o pretendido pela CBF.

Com a nomeação deles, dois profissionais infelizmente foram deixados de lado: Tite e Rodrigo Caetano. O treinador pelas conquistas que fez no Sul à frente de Grêmio e Internacional e por tudo o que conquistou no Corinthians atualmente, e não falo só de títulos. O segundo, pela gana apresentada nos trabalhos à frente de Grêmio e Vasco, que o levaram, merecidamente, a ser contratado no fim da temporada passada pelo Fluminense, campeão brasileiro, para seguir o ótimo trabalho como diretor de futebol. Sem contar o que uma pessoa nova como ele poderia agregar ao proposto pela entidade. Antes que me perguntem, sim, fui a favor de Guardiola no comando da Seleção quando especulado.


Os ideais para assumir o comando máximo do futebol brasileiro: Tite
e Rodrigo Caetano, profissionais "desperdiçados" pela CBF
(Foto: Montagem/Luiz Queiroga)
Só lamento a forma bisonha como conduzem o esporte mais adorado do mundo e tentam demonstrar que sabem lidar com ele para o torcedor. Cadê a moral de exigir de Neymar e companhia um futebol vistoso e alegre, pra cima, ousado, enquanto os homens que representam a CBF se apoiam no passado, na retranca de Felipão? Como falar de nacionalismo num país que foi educado a largar os seus ídolos e não retribuir tudo o que promoveram em nome do nosso futebol. Enquanto craques como Michel Platini e Franz Beckenbauer participam ativamente da administração do esporte na Europa e são a todo o momento homenageados pelos seus feitos no passado e atualmente, Pelé e uma verdadeira seleção de boleiros sofrem com a falta de respeito e reconhecimento por aqui.

E dentro de toda essa hipocrisia, o homem que representa diante da FIFA o futebol brasileiro é o mesmo que, como atacou o jornalista Juca Kfouri, “fartamente” foi o responsável pela prisão e, consequentemente, pela morte do jornalista Vladimir Herzog durante a Ditadura Militar, já que “na época, Marin era deputado e em discursos elogiava o trabalho do torturador Sérgio Paranhos Fleury e colaborava com as denúncias sobre a existência de comunistas na TV Cultura, cujo jornalismo era dirigido por Herzog”, segundo publicou Kfouri. Como, senhor presidente José Maria Marin, tem a coragem de apelar para o amor ao país e falar de mudanças, se é um dos principais exemplos de retrocesso do futebol brasileiro?


Enquanto o futebol brasileiro é comandado inteiramente por bandidos, na Europa
existe profissionais preocupados em combater a corrupção e administrar
da melhor maneira o esporte; Michel Platini (direita), é um desses homens
(Foto: Montagem/Luiz Queiroga)

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